A forma como o surdo é visto mudou ao longo dos anos; da proibição ao reconhecimento da sua importância, as línguas de sinais fazem parte dessa história
Thayse Goulart Strazzi faz o sinal de livro em Libras. (Crédito: Liliane Jochelavicius)
Quando as instituições de atendimento a surdos surgiram, elas tinham uma visão voltada para a reabilitação. O foco não era apenas educar, mas que o surdo adquirisse a língua portuguesa oral. A surdez era vista como uma patologia a ser curada. Dentro dessa perspectiva, encaixa-se o uso de próteses auditivas ou do implante coclear, como explica o
responsável pelo departamento de surdez na Secretaria de Estado da Educação (SEED), Júlio Cesar Correia Carmona.
Na década de 1970 perdurou a Comunicação Total, que era o uso de técnicas para a aquisição da língua oral e do português escrito. A língua de sinais era apenas um recurso que poderia ser utilizado.
A política atual adotada pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) e também pela SEED é a do bilinguismo, que é o respeito da Libras como língua natural das pessoas surdas e o uso do português escrito. Carmona conta, a partir de pesquisa realizada pelo psicólogo Fernando Capovilla, que o bilinguismo é a melhor opção de educação para surdos que usam a Libras. Por outro lado, a inclusão, em escola regular com intérprete, pode ser boa opção para o deficiente auditivo que não tem a Libras como sua primeira língua.
Na linha do tempo abaixo é possível acompanhar algumas das principais mudanças na educação de surdos.
Linha do tempo Libras e edcuação. (Fonte: MEC e INES/ Crédito: Liliane Jochelavicius)
Dificuldades enfrentadas
Jeanen Pavlovski Machado, que é especialista em Educação Especial e Bilinguismo, e trabalha com atendimento aos surdos na Lapa, diz que o grande problema enfrentado pelos interpretes é não ter acesso ao conteúdo de aula com antecedência. Em razão da Libras ter estrutura diferente do português, é preciso que muitas informações
sejam adaptadas para que os surdos entendam.
Para deixar clara as dificuldades, Jeanen conta que, por exemplo, foi um desafio explicar a alunos surdos o que é um cão vira-lata. Para isso, precisou buscar imagens de cães de raça, sem raça, de rua e procurando alimento em latas de lixo, a fim de esclarecer o conteúdo do texto que estavam estudando. Isso acontece porque o português e a Libras não são línguas correspondentes, e a comunicação do surdo é visual e não auditiva.
Há dificuldades enfrentadas na educação de surdos, assim como há na educação de ouvintes. Segundo a especialista, o que aumenta o desafio é o fato de, muitas vezes, as aulas não serem pensadas para eles. É aí que o intérprete de Libras precisa encontrar estratégias para tornar o conteúdo mais compreensível. As aulas normalmente não têm os recursos visuais necessários para o aprendizado de um estudante surdo.
Thayse Goulart Strazzi, que é surda e estudou em escola regular, relata sua experiência:
Thayse Goulart Strazzi conta sua experiência com estudante surda em escola regular. (Crédito: Liliane Jochelavicius)
Ensino superior
A disciplina de Libras começou a ser ofertada nos cursos de graduação de forma gradativa. Como previsto no Decreto 5.626/2005, em geral ela está nos cursos de Fonoaudiologia e de formação de educadores, como Pedagogia, Licenciaturas e especializações em Educação Especial.
Em 2006, começou o primeiro curso de Letra-Libras, oferecido pela Universidade Federal de Santa Catarina, com polos nas cinco regiões do Brasil. Nesse curso, a Libras é a língua de instrução e a preferência é dada a estudantes surdos. No mesmo ano foi realizado o primeiro Programa Nacional para a Certificação de Proficiência no Uso e Ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras e para a Certificação de Proficiência em Tradução e Interpretação da Libras/Língua Portuguesa (Prolibras).
Em 2012 foi inaugurado o campus Palhoça-Bilíngue do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina, primeira unidade bilíngue (libras-português) da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica. Em Curitiba, o Curso de Letras-Libras da Universidade Federal do Paraná teve sua primeira turma em 2015. Agora a Faculdade São Braz também oferece o curso.