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Fernanda Bueno

Cultura afrodescendente aparece encoberta em Curitiba

Apesar do eurocentrismo dominante, história de pontos turísticos relembra memória dos negros

A Igreja do Rosário foi construída para os escravos e ainda mantém os azulejos da capela original. (Crédito: Monize Ramos)

Curitiba, tal como conhecemos hoje, nasceu a partir da influência de diversas culturas. A configuração da população, por exemplo, é marcada por influências de imigrantes italianos, alemães, poloneses, ucranianos e asiáticos. Da mesma forma, e com a mesma expressão, os escravos também influenciaram na cultura desta população, com tradições e costumes que apresentam-se por toda a cidade.

É possível observar os traços da cultura afrodescendente nos padrões arquitetônicos e festas que procuram resgatar a história da chegada dos negros na cidade. No entanto, toda a riqueza vinda dos afrodescendentes ainda não ganhou pleno destaque na cidade. A influência do eurocentrismo acaba dando destaque para o conjunto de elementos dos costumes europeus.

O Doutor em Antropologia Social, pela UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas) e também professor do Departamento de História da UFPR (Universidade Federal do Paraná), Hector Guerra Hernandez, afirma que o pouco interesse da elite dominante da cidade, e de suas instituições, é um dos motivos da falta de visibilidade da cultura africana na cidade. "Perante esta situação, a população afrodescendente tem pagado historicamente, através de um injusto e sistemático silenciamento", declara o professor.

Segundo o professor, por muito tempo, as histórias da população afrodescendente, não foram contadas por conta do pouco espaço que era aberto para esse público. Com a aprovação de leis que garantam o espaço de negros no ensino superior público, dentre outras políticas públicas, há uma significativa inserção das diversas manifestações sociais e culturais da população afrodescendente, explica o pesquisador.

A Praça Zumbi dos Palmares, o Pelourinho de Curitiba e a Lavação da Escadaria da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos. São esses os pontos turísticos e e eventos de manifestação social que Jessica Tayana, 23 anos, já teve a oportunidade de conhecer e participar. Além de achar muito importante a representatividade da cultura na cidade, Jessica observa: "Não dá pra deixar de afirmar que ainda tem pouca representatividade comparado com a quantidade de outros pontos turísticos".

Hernandez afirma que a observação de Jessica é uma realidade que pode não durar por muito tempo. Ele afirma que o ingresso de afro-brasileiros em universidades do Paraná pode mudar os aspectos históricos na cidade. "Esta situação tem contribuído para visibilizar a presença negra na cidade, desde uma perspectiva diacrônica, e chega ao ponto de questionar a branquitude normativa que se respira na cidade", declara o historiador.

Participação da população

Franciele Fraire, 27 anos, curitibana de descendência negra, atualmente mora em Santiago e afirma que sempre que vem à cidade, procura passar pelos pontos turísticos que contam a história da sua cultura. "Eu vejo alguns nomes e pessoas que despontam na cultura, como a Karol Conká, os Encantados ou mesmo a galera que é do pagode. Mas em termos de povão, o negro não se reconhece como sendo negro. Então, tão pouco há reconhecimento externo", avalia.

O Movimento Negro, por exemplo, tem um núcleo que concentra pessoas que constroem projetos para criar museus, promover festas e realizar eventos que possam contribuir para relembrar a presença da cultura africana na cidade.

Porém, Franciele afirma que nem todos querem participar dos movimentos.

Hector Guerra Hernandez explica que promover atividades que contribuam a visibilizar a cultura negra é de extrema importância para que a população afrodescendente tenha formas de relembrar e marcar sua história e memória. No entanto, o professor declara que há um retrocesso por conta da decisão da prefeitura de anular o feriado do dia da consciência negra, que era no dia 20 de novembro.

"A importância de dar relevância a estas iniciativas contribuirá para o combate contra o preconceito e racismo, muitas vezes solapado em ideologias de origem que precisam ser revistas e, desta maneira, fazer justiça a uma população curitibana afrodescendente", finaliza o professor.

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