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Por Tuba do Sul

Dez anos sem Lala Schneider

Profissionais do teatro comentam suas experiências com a primeira-dama da arte cênica no Paraná

Lala Schneider em O vampiro e a polaquinha. (Crédito: Gilson Camargo/Agência de Notícias do Paraná)

No último dia 28 de fevereiro, completaram-se dez anos que o Paraná e o Brasil perderam uma grande personalidade das artes cênicas. No último dia 23 a atriz Lala Schneider teria completado 91 anos de vida. Natural de Irati, sudeste do Estado, e falecida em Curitiba, Lala é conhecida como “a primeira-dama do teatro paranaense”. Atuou também como diretora e professora de teatro.

A carreira teatral de Lala teve início em 1950, com a peça O poder do amor, exibida no Teatro de Adultos do Serviço Social da Indústria (SESI). Desde então, foram dezenas de encenações e 16 prêmios. Destes últimos, destaca-se o Troféu Gralha Azul, principal premiação do teatro paranaense, entregue atualmente no Festival de Curitiba e conquistada por Lala duas vezes na categoria melhor atriz, em 1984/85 por Colônia Cecília e em 1992/93 por O vampiro e a polaquinha.

A artista também esteve presente na televisão. Foram quatro novelas na TV Paraná (atual CNT Curitiba) e outros quatro trabalhos na Rede Globo: as novelas Lua cheia de amor (1990) e Felicidade (1991), a minissérie Tereza Batista (1992) e um episódio do seriado A diarista (2006).

Outra área em que se destacou foi o cinema, tendo sido vencedora do Kikito de Melhor Atriz do Festival de Cinema de Gramado (RS) em 2004, por sua atuação no filme Vovó vai ao supermercado.

Sobre Lala: “Ela era uma artista pura e nata”

Em 1994, foi homenageada com a inauguração de um teatro com seu nome no Centro de Curitiba. Atualmente, o Teatro Lala Schneider possui um curso livre de interpretação. O coordenador da iniciativa, Rogério Bozza, está trabalhando no local há 19 anos. Ele conta que conheceu a atriz pessoalmente em 1978, quando ela era professora do curso do Teatro Guaíra.

A relação entre os dois estreitou-se quando estavam morando no Rio de Janeiro. Ela estava fazendo novelas na Rede Globo e ele tentava construir carreira por lá.

“Lala teve uma trajetória das mais brilhantes no significado do que é ser um verdadeiro artista. Um verdadeiro artista, principalmente um ator de teatro, não é aquele que busca a celebridade, a fama, ser famoso, ganhar muito dinheiro. O teatro tem um poder de transformação na sociedade. Ele não está aqui apenas para divertir. É claro que também é entretenimento. Mas ele está aqui para a transformação, e Lala sabia disso mais que todo mundo”, diz Bozza.

“Então toda a trajetória dela foi muito firme no sentido de amar o teatro. Ela tinha uma índole como artista pura e nata. Era natural, era dela. Ela não chegou a fazer nenhum curso de teatro para ser atriz. Foi instintiva.”

O coordenador fala ainda sobre o início nas artes cênicas: “Na época em que trabalhava no SESI, ela fazia teatro amador. E aí veio uma grande atriz e produtora, a Dulcina de Moraes, com um espetáculo de São Paulo para Curitiba, e precisava de uma atriz para substituir outra, que não podia viajar. Chamaram-na porque ela se familiarizava mais com o personagem, tudo isso. E a partir daí ela surgiu, a grande Lala Schneider. E ela era uma atriz por inteiro, o tempo todo na vida dela. Ela era muito intensa como atriz. Como pessoa, uma pessoa maravilhosa. E muito intensa na arte de representar.”

Rogério Bozza, ator e coordenador do curso de teatro do Lala Schneider. (Crédito: Tuba do Sul)

Em relação a trabalhos específicos, Bozza destaca a premiada atuação em O vampiro e a polaquinha, peça baseada em livro de Dalton Trevisan. “Mas ela teve muitos trabalhos significativos. Não dá para dizer que um foi maior que o outro”, diz. “Todos eles foram muito intensos, mesmo os mais simples. Com ela, por exemplo, trabalhei no musical Cem anos de solidão, em cima da obra de Gabriel García Márquez, em que eu fazia o marido dela. Era uma peça que trabalhava com passado e presente, outro marco na vida dela.”

“Ensinou muito sobre ser humano”

Sobre o papel de Lala na arte paranaense e brasileira, o coordenador afirma: “Todo mundo que se refere a ser um verdadeiro artista, aquele que, além de aprender, ensina muito sobre ser humano, essa é Lala Schneider. A importância que ela tem não é apenas para a classe teatral. Para nós é muito importante. Nós, que fazemos teatro, temos a Lala como uma patronesse, uma benfeitora, que acolhe os atores mais jovens."

"Lala morreu com 80 anos. Nesses anos, acho que mais ou menos uns sessenta e poucos ela dedicou à arte paranaense. E ela é considerada atração em paralelo: como Fernanda Montenegro, que é a grande dama do teatro brasileiro, ela é a grande dama do teatro paranaense. Então ela tem inúmeros movimentos em que ajudou na situação de criar uma cultura teatral paranaense. Ela faz parte daqueles que entregaram aos mais jovens um teatro constituído”, comenta Bozza.

“Ter Lala como professora foi um privilégio”, diz produtor do Guaíra

Outro que conheceu Lala quando trabalhava como professora foi o produtor do Teatro Guaíra, Áldice Lopes. “Quando comecei a fazer escola de teatro em Curitiba, em 1982, a Lala foi a professora indicada para nos orientar nesse primeiro ano”, conta, acrescentando que foi a primeira turma em que a artista entrou com essa função. “Foi um privilégio tê-la durante esse ano em que ela trabalhou com a gente. E depois voltou no último ano, em 1985. Foi quando tivemos o prazer de tê-la como professora e orientadora de interpretação.”

Lopes ainda lamenta o pouco conhecimento dos estudantes de Artes Cênicas sobre quem foi Lala Schneider. “São pouquíssimas as pessoas que sabem. Acho que falta, nos centros universitários, ensino médio e escolas de teatro, uma cadeira de teatro paranaense. Temos atrizes, atores e diretores brilhantes que as pessoas não têm noção de quem são”, diz, citando como exemplo Salvador de Ferrante, fundador da primeira companhia de teatro em Curitiba.

O produtor relata um momento difícil sofrido por ele e pela atriz: “Quando nós montamos, em 1986, o primeiro trabalho profissional, chamamos a Lala para fazer uma participação especial nesse espetáculo. E, durante o ensaio, ela sofreu um derrame muito forte. Fomos nós que a levamos para o hospital e acabou que ela sofreu um aneurisma cerebral. Conseguimos a tempo levá-la até lá. Entrou por um processo de cirurgia, foi uma coisa muito grave. A preocupação era que não ficassem sequelas. Quando voltou à consciência, ela falava o tempo todo: ‘eu preciso voltar a cena. Eu vou melhorar se voltar a cena e se continuar a fazer o espetáculo que eu estava ensaiando.’”

Já sobre a trajetória da artista, Lopes comenta: “Na busca da intuição, ela conseguia ser grande e sempre a melhor. Na televisão, fazia sempre os grandes papéis, trabalhava sempre como as grandes protagonistas.” No cinema, o produtor cita o filme Aleluia Gretchen, de Sylvio Back: “Filme premiadíssimo, em que ela faz uma participação maravilhosa.”

Voltando ao teatro, ele revela: “Ela trabalhou com todos os grandes diretores”, destacando Ademar Guerra, que dirigiu Colônia Cecília. “Ela é a primeira-dama do teatro paranaense. Mas se estende para o teatro brasileiro. Está fincada aqui na praça Santos Andrade (em frente ao Teatro), com um busto em homenagem a essa grande atriz, essa grande mulher. É uma pessoa que está marcada e gravada na página do teatro curitibano, do teatro paranaense, por ser essa pessoa generosa, talentosa e que o tempo todo se doou muito para a arte. Fazia espetáculo em produção que tinha dinheiro e que não tinha."

Lopes encerra comentando o grande ensinamento que Lala transmitiu a ele: “Ela falava isso o tempo todo: o teatro é a arte da coletividade. A gente não faz teatro sozinho.”

O Teatro Lala Schneider

Criado pelo ator e diretor João Luiz Fiani em 1994, o Teatro Lala Schneider está localizado na rua Treze de Maio, no Centro de Curitiba. Juntas, suas três salas totalizam 325 lugares, número inferior ao do Guairinha, que conta com 496 poltronas. Na menor sala, batizada de Armando Maranhão em homenagem ao fundador do Teatro de Estudantes do Paraná, não há poltronas, e sim 40 cadeiras de plástico.

Os números modestos proporcionam maior proximidade com os artistas no palco. Mensalmente, o local recebe em média 10 mil espectadores e cerca de 40 apresentações, em geral comédias e peças infantis, muitas dirigidas pelo próprio Fiani. Participou recentemente do Festival de Teatro de Curitiba.

Logo na fachada, um anúncio diz: “Curso de teatro é no Lala”. O curso livre é mantido pelo Núcleo de Profissionalização Teatral (NPT), criado pelo próprio Teatro na época de sua fundação. Os três níveis (Iniciante, Básico e Avançado) têm duração de um ano cada um. Há disciplinas teóricas, como história do teatro e elementos cênicos, e práticas, como interpretação e expressão corporal. A iniciativa, que atende alunos de todas as idades, conta com professores atuantes no cenário teatral paranaense.

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